sábado, 14 de agosto de 2010

JONGO

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Apresentação de Jongo do Grupo de Caxambu Michel Tannus de Porciúncula-RJ

Jongo é uma manifestação cultural essencialmente rural diretamente associada à cultura africana no Brasil e que influiu poderosamente na formação do Samba carioca, em especial, e da cultura popular brasileira como um todo.

Inserindo-se no âmbito das chamadas 'danças de umbigada' (sendo portanto aparentada com o 'Semba' ou 'Masemba' de Angola), o Jongo foi trazido para o Brasil por negros bantu, sequestrados nos antigos reinos de Ndongo e do Kongo, na região compreendida hoje por boa parte do território da República de Angola.

Composto por música e dança características, animadas por poetas que se desafiam por meio da improvisação, ali, no momento, com cantigas ou pontos enigmáticos ('amarrados') , o Jongo tem, provavelmente, como uma de suas origens mais remotas (pelo menos no que diz respeito á estrutura dos pontos cantados) o tradicional jogo de adivinhas angolano, denominado Jinongonongo.

Uma característica essencial da linguagem do Jongo é a utilização de símbolos que, além de manter o sentido cifrado, possuem função supostamente mágica, provocando, supostamente, fenômenos paranormais. Dentre os mais evidentes pode-se citar o fogo, com o qual são afinados os instrumentos; os tambores, que são consagrados e considerados como ancestrais da comunidade; a dança em círculos com um casal ao centro, que remete à fertilidade; sem esquecer, é claro, as ricas metáforas utilizadas pelos jongueiros para compor seus "pontos" e cujo sentido é inacessível para os não-iniciados.

Hoje em dia podem participar do Jongo homens e mulheres, mas esta participação, em sua forma original era rigorosamente restrita aos iniciados ou mais experientes da comunidade. Este fator relaciona-se a normas éticas e sociais bastante comuns em diversas outras sociedades tradicionais - como as indígenas americanas - baseadas no respeito e obediência a um conselho de indivíduos 'mais velhos' e no 'culto aos ancestrais'.

Pesquisas históricas indicam que o Jongo possui, na sua origem, relações com o hábito recorrente das culturas africanas de expressão bantu, durante o período colonial, de criar diversas comunidades, semelhantes a sociedades secretas e seitas político-religiosas especializadas, dentre as quais podemos citar até mesmo irmandades católicas, como a Congada. Estas fraternidades tiveram importante papel na resistência à escravidão, como modo de comunicação e organização, e até mesmo comprando e alforriando escravos.

Dançado e cantado outrora com o acompanhamento de urucungo (arco musical bantu, que originou o atual berimbau), viola e pandeiro, além de três tambores consagrados, utilizados até os nossos dias, chamados de Tambu ou 'Caxambu', o maior - que dá nome a manifestação em algumas regiões - 'Candongueiro', o menor e o tambor de fricção 'Ngoma-puíta' (uma espécie de cuíca muito grande), o Jongo é ainda hoje bastante praticado em diversas cidades de sua região original: o Vale do Paraíba na Região Sudeste do Brasil, ao sul do estado do Rio de Janeiro e ao norte do estado de São Paulo. Entre as diversas comunidades que mantêm (ou, até recentemente, mantiveram) a prática desta manifestação, pode-se citar, como exemplo, as localizadas na periferia das cidades de Valença, Vassouras , Paraíba do Sul e Barra do Piraí (Rio de Janeiro) além de Guaratinguetá e Lagoinha (São Paulo), com reflexos na região dos rios Tietê, Pirapora e Piracicaba, também em São Paulo (onde ocorre uma manifestação muito semelhante ao Jongo conhecida pelo nome de 'Batuque') e até em certas localidades no sul de Minas Gerais.

Na cidade do Rio de Janeiro, a região compreendida pelos bairros de Madureira e Oswaldo Cruz, já nos anos imediatamente posteriores à abolição da escravatura, centralizou durante muito tempo a prática desta manifestação na zona rural da antiga Corte Imperial, atraindo um grande número de migrantes ex-escravos, oriundos das fazendas de café do Vale do Paraíba. Entre os precursores da implantação do Jongo nesta área se destacaram a ex-escrava Maria Teresa dos Santos muitos de seus parentes ou aparentados além de diversos vizinhos da comunidade, entre os quais Mano Elói (Eloy Anthero Dias), Sebastião Mulequinho e Tia Eulália, todos eles intimamente ligados a fundação da Escola de Samba Império Serrano, sediada no Morro da Serrinha.

A partir de meados da década 70, no mesmo Morro da Serrinha, o músico percussionista Darcy Monteiro 'do Império' (mais tarde conhecido como Mestre Darcy), a partir dos conhecimentos assimilados com sua mãe, a rezadeira Maria Joana Monteiro (discípula de Vó Teresa), passando a se dedicar á difusão e a recriação da dança em palcos, centros culturais e universidades, estimulando por meio de oficinas e workshops, a formação de grupos de admiradores do Jongo que, embora praticando apenas aqueles aspectos mais superficiais da dança, deslocando-a de seu âmbito social e seu contexto tradicional original, dão hoje a ela alguma projeção nacional.

Ainda no âmbito da cidade do Rio de Janeiro, é digno de nota também o 'Caxambu do Salgueiro', grupo de Jongo tradicional que, comandado por Mestre Geraldo, animou, pelo menos até o início da década de 1980, o Morro do Salgueiro, no bairro da Tijuca e era composto por figuras históricas daquela comunidade, entre as quais Tia Neném e Tia Zezé, famosas integrantes da ala das baianas da Escola de Samba G.R.E.S Acadêmicos do Salgueiro.

Em 1996 aconteceu no município de Santo Antônio de Pádua, Rio de Janeiro, o I Encontro de Jongueiros, resultado de um projeto de extensão da Universidade Federal Fluminense/UFF, desenvolvido pelo campus avançado que a universidade possui neste município. Deste encontro participaram dois grupos de jongueiros da cidade e mais um de Miracema, município vizinho. A partir daí, o encontro passou a ser anual. Hoje, cerca de treze comunidades jongueiras participam deste Encontro. O mais recente, o XII Encontro de Jongueiros, foi realizado nos dias 25 e 26 de abril de 2008 em Piquete / SP e teve a participação de 1000 jongueiros das cidades de Valença-Quilombo São José, Barra do Pirai, Pinheiral, Angra dos Reis, Santo Antônio de Pádua, Miracema, Serrinha, Porciúncula, Quissamã, Campos, São Mateus, Carangola, São José dos Campos, Guaratinguetá, Campinas e Piquete.

Em 2000, durante a realização do V Encontro de Jongueiros, em Angra dos Reis, Rio de Janeiro, foi criada a Rede de Memória do Jongo e do Caxambu cujo objetivo é organizar as comunidades jongueiras e fortalecer suas lutas por terras, direitos e justiça social.

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